"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Precisamos discutir o tamanho do Estado brasileiro


“Se tomaremos a decisão por mais Estado ou menos Estado, resta claro que ele permanecerá lá, ainda firme. Não alcançaremos o status de Anarquia. Precisamos, todavia, aumentar sua capacidade de transparência e sua eficiência”

 VINÍCIUS SOUSA 
 
As reformas política, trabalhista e previdenciária em tramitação na Câmara dos Deputados mostram que é inadiável o debate sobre qual deve ser o tamanho do Estado brasileiro. Se no período de bonança não paramos para discutir qual nível de participação do Estado queremos enquanto sociedade, esse debate precisa acontecer agora, no momento da crise. Nós, cidadãos, estamos reféns de um Estado visto como ineficiente e corrupto, em todos os sentidos e ideologias. Isso não pode continuar assim por muito tempo.

É inegável que a constituição brasileira sofreu influências dos modelos social-democrata e do Estado de Bem-Estar Social, muito comuns entre os países europeus à época da sua proclamação. Estas concepções políticas, que priorizam a distribuição mais equitativa das riquezas geradas pela sociedade e o estabelecimento de mecanismos de proteção social, respectivamente, foram importantes para a formação do quadro de políticas públicas hoje existentes e para o nível de garantias e direitos estabelecidos na Carta Magna.

Não obstante, tais modelos se concretizaram no período da redemocratização brasileira, no final da década de 80, vindos de contextos de crise, haja vista estarem sob constantes críticas por conta do aumento no nível de desemprego nos países.

Como exemplo, o famoso informe da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) de 1981, diagnosticava que o Estado de Bem-Estar Social estaria em crise após seus “30 anos gloriosos” (1945-1975). A justificativa se baseia na lógica de que o aumento do desemprego acarreta impactos negativos nas finanças do Estado, pois este estaria impelido a repassar o seguro-desemprego ao passo que o nível de contribuição estaria em queda.

Isso talvez diga muito sobre o que percebemos do nosso texto constitucional, tendo em vista a diminuição da sua capacidade de ser exequível diante da situação crítica do país, com quase 13 milhões de desempregados e deficit primário, dos últimos 12 meses, correspondendo a quase 2,5% do PIB.

Ademais, a alta taxa de endividamento mostra que precisamos repensar a lógica dos gastos do Estado. Quais devem ser as prioridades do “Estado empresário”? Em que agendas o Estado deve priorizar o investimento e a participação? Quais são os limites do “Estado fiscal”? Qual o nível de contribuição tributária é suficiente para regular a relação Estado-Sociedade? Estas perguntas precisam, com urgência, fazer parte da realidade dos cidadãos, para que possamos, conjuntamente, melhorar a máquina estatal.

Exemplo dessa urgência foi a operação deflagrada pela polícia federal na semana passada. Denominada de Operação Bullish, ela investiga possíveis fraudes e irregularidades na concessão de aportes financeiros do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a JBS, um dos maiores frigoríficos do Brasil e do mundo.

Esta operação apenas evidencia o que já se desconfiava, não apenas em relação a este frigorífico, mas entre outros empreendimentos brasileiros de grande porte: há a presença elevada e desnecessária de subsídios e empréstimos de origem estatal.

Pesquisadores, como os economistas Sérgio Lazzarini e Alexandre Schwartsman, não veem grandes justificativas para tal atuação estatal, que mais se assemelha a uma versão do “Bolsa família”, o “Bolsa Empresário”.

Eles atestam que empreendimentos semelhantes à JBS possuem pouco impacto no desenvolvimento industrial do país e conseguiriam empréstimos financeiros equivalentes na iniciativa privada – contando, contudo, com menos benesses, como juros menores e maiores prazos para a quitação do débito.

Nos resta, porém, nos indignarmos com esta realidade e reivindicarmos maior accountabillity das operações do BNDES, assim como o uso dos empréstimos como investimentos em empreendimentos que realmente necessitem do aporte financeiro de origem estatal.

Neste mesmo jornal, Andre Rafael, co-idealizador do Projeto Brasil 2030, nos alerta que muitos dos problemas no modelo de financiamento do Estado brasileiro são decorrentes da inexistência de esforço consistente e contínuo de tornar a Constituição plenamente exequível.

Se não houver esta revisão do texto constitucional, seus direitos e garantias, podemos ver se concretizar a visão do Estado mínimo, ao qual André avalia que isso poderá surgir não pela crença da sociedade nos princípios liberais, mas pela necessidade de ter o mercado como alternativa ao Estado e sua dificuldade em fomentar políticas públicas que correspondam ao interesse dos cidadãos.

Se tomaremos a decisão por mais Estado ou menos Estado, resta claro que ele permanecerá lá, ainda firme. Não alcançaremos – seguramente não nos próximos anos – o status de Anarquia. 

Precisamos, todavia, aumentar sua capacidade de transparência e sua eficiência. Como disse José Murilo de Carvalho, em seu livro Cidadania no Brasil: o longo caminho, “os progressos feitos são inegáveis, mas foram lentos e não escondem o longo caminho que ainda falta percorrer”.

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