"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Tocqueville e Marx: fundamentais para compreender a democracia


Dois pensadores, ainda que ideologicamente opostos, são fundamentais no entendimento da emergência da democracia nos tempos contemporâneos: o primeiro deles foi Alexis de Tocqueville (1805-1859) o outro foi Karl Marx (1818-1881).

Alexis de Tocqueville

Tocqueville, então um jovem aristocrata francês muito estudioso, decidiu fazer uma viagem aos Estados Unidos em 1830 para estudar o sistema penal americano, considerado inovador e muito diferente daquele que era praticado na Europa. No país, Tocqueville teve sua atenção desviada para uma série de outros aspectos da vida americana, entre eles chamou-lhe a atenção o funcionamento da democracia.

Os Estados Unidos na época era o único país do mundo onde inexistia uma nobreza governante e onde o clero não tinha força política. Ficou impressionado como o povo, reunido em qualquer recinto, decidia as coisas por si, sem nenhuma ingerência de uma força externa (Estado ou Igreja). Era das assembleias populares e das eleições periódicas que nasciam os legisladores e os governantes. Portanto, tratava-se de uma excepcionalidade naquela época.

O resultado de suas observações, extraído de uma longa viagem que ele realizou por vários estados, que se somou à intensa leitura de obras a fins gerou um livro que o imortalizou, A Democracia na América, publicado em dois volumes entre 1835 e 1840.

Constatou que os Estados Unidos passavam por uma grande revolução social, a Revolução Democrática, que vinha se desenrolando desde que os americanos proclamaram sua independência em 1776.

Isso fora resultado da chegada dos emigrantes europeus que, não podendo exercer seus direitos civis na Europa, trataram de criá-los no Novo Mundo e se rebelaram contra o rei da Inglaterra quando tentou cerceá-los.

Mesmo não sendo adepto da democracia, afinal ele vinha de berço aristocrático, Tocqueville reconheceu que um fenômeno novo surgia no horizonte político da humanidade. O que estava acontecendo na América do Norte de algum modo se espalharia pelo mundo todo. Como ele confessou:

"Admito que na América, vi mais do que a América; procurei alguma imagem da própria democracia, dos seus pendores, do seu caráter, dos seus preconceitos, das suas paixões; desejei conhecê-la ainda que fosse apenas para saber o que devemos esperar ou temer da parte dela".

Ele verificou que esta tendência de introduzir um regime de igualdade política, de aplainar as diferenças entre nobres e plebeus, entre ricos e pobres, vinha se desenvolvendo há muito tempo. Segundo ele, na França desde os séculos 12 e 13 já se podia notar o declínio da hegemonia absoluta que aristocracia exercia sobre o restante da sociedade: "o nobre terá descido na escala social e a ela estaria subindo o plebeu", atingindo seu clímax na Revolução de 1789.

Este fenômeno, esta marcha pela igualdade, estava se generalizando nas sociedades cristãs que estavam passando pela mesma revolução.

"Em toda a parte viram-se vários acontecimentos da vida dos povos revelarem-se em proveito da democracia: todos os homens a têm ajudado com seus esforços (...). Por isso mesmo, o gradual desenvolvimento da igualdade é uma realidade providencial. Dessa realidade, tem como a principal característica ser universal (...) todos os acontecimentos assim como todos os homens servem ao seu desenvolvimento".

Tocqueville acreditava que a democracia, depois de desalojar e destruir o sistema feudal e vencer os reis, certamente não iria recuar frente à burguesia e a classe rica. Ainda que não soubesse prever seu destino final, ela iria se espalhar pelo mundo inteiro como se fora uma força da Providência. "Neste caso", afirmou em certo momento, "querer deter a democracia seria como lutar contra o próprio Deus".

Karl Marx

Para Karl Marx, filósofo judeu-alemão que vivia no exílio em Londres, a democracia era o produto de uma dupla revolução que ocorrera não século 18:

- A Revolução Industrial inglesa, a Revolução da Tecnologia, que fizera por promover o surgimento de uma nova classe social, o operário fabril (ou o proletário). As fábricas haviam provocado um enorme desenvolvimento produtivo e com isso projetaram tanto uma nova classe proprietária (os capitalistas donos das empresas) como seus antagonistas, os operários. Marx previu que as lutas sociais futuras seriam travadas entre estas duas classes e que o resultado final do enfrentamento entre o capital x trabalho seria a vitória da maioria, isto é da classe trabalhadora.

- A Revolução Francesa de 1789, a revolução social e política que teve como mérito principal destruir para sempre com a ordem feudal e o regime absolutista cujos privilégios favoreciam a aristocracia e o clero. Abriu-se, deste modo, o espaço para o surgimento da sociedade burguesa que firmara seu compromisso com a igualdade de todos perante a lei (se bem que não a igualdade dos direitos políticos, pois, numa primeira fase desta democracia incipiente somente os que tinham renda é que tinham direito ao voto). Mal ou bem, a sociedade burguesa era mais avançada do que a feudal o que permitiria às classes trabalhadoras se organizarem em sindicatos e partidos e, talvez, no futuro, chegar ao poder por meio do voto (esta possibilidade não foi defendida por Marx as sim por seus seguidores alemães do Partido Social-Democrata).

Portanto, a combinação daquelas duas revoluções, a tecnológica e a política, conduziriam a humanidade inapelavelmente ao regime da democracia sob domínio das massas emancipadas. Todavia, a concepção de democracia de Marx não se ateve ao ritual da democracia liberal-representativa baseada em eleições, no sufrágio universal e na divisão dos poderes.

Como demonstrou nas suas análises sobre a fracassada Comuna de Paris, de 1871, ele era simpático à democracia direta colocando as entidades políticas e as instituições sociais nas mãos do povo porque Marx acreditava na supressão futura do Estado, o que dispensaria a existência de deputados, senadores, governadores, etc. De algum modo, entendia ele, algum tipo de democracia iria predominar como regime comum da humanidade.

Para os dois, tanto para o pensador liberal como para o marxista, o futuro seria o império das massas e a democracia o seu corolário.

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