"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Projeto Nacional


Voltou-se a falar em “projeto nacional”. O governo apontaria rumos para o país, fixaria metas e indicaria o que espera do setor privado. É surpreendente, mas a visão de que o estado deve liderar o desenvolvimento ainda permeia as discussões sobre a economia, particularmente em segmentos do empresariado e da esquerda.


A ideia é típica de regimes autoritários. Nasceu na ex-União Soviética com o Primeiro Plano Quinquenal, lançado em 1928 por Josef Stalin (1879-1953). A expansão posterior da economia soviética parecia provar que existia uma alternativa ao capitalismo. O planejamento central permitiria vencer o subdesenvolvimento. A ilusão se foi com o colapso soviético em 1991.


Nos ·anos 1930, a necessidade de enfrentar o desastre da Grande Depressão criou o ambiente para fone intervenção do estado na economia. O intervencionismo foi impulsionado pelas ideias de John Maynard Keynes (1883-1946), que advogava a expansão do gasto público – preferencialmente em infraestrutura – para compensar a relação que então se observava na demanda de consumo e investimento.


A intervenção estatal se disseminou com o New Deal de Franklin Roosevelt (1882-1945), os planos de Adolf Hitler (1889- 1945) e as experiências autoritárias da Espanha e de Portugal. Getúlio Vargas (1882-1954) a introduziu no Brasil em seu primeiro governo. Depois da II Guerra, o planejamento virou ministério nos países em desenvolvimento. O nosso é de 1962. Seu primeiro titular foi Celso Furtado (1920-2004).
O regime militar entronizou os grandes planos. 


O “projeto nacional” viria para valer com o Primeiro Plano Nacional de Desenvolvimento (1 PND) para o período 1972-1974, no governo de Emílio Médici (1905-1985). O auge foi o II PND (1975-1979), no governo Ernesto Geisel (1907-1996). Era uma resposta à crise do petróleo de 1973-1974 e previa um salto na substituição de importações. Essa estratégia, que caracterizara por trinta anos a ação do governo, miraria agora bens de capital e insumos básicos.


No fim dos anos 1970, começaram a aparecer os efeitos negativos da excessiva intervenção estatal em todo o mundo. No Brasil, surgiram as ideias de privatização e abertura da economia, e a crítica à substituição de importações. O III PND (1980-1985), o último dos planos, veio sem linhas grandiosas. Ficou quase incógnito.


Com a democratização, o aumento de gastos sociais, a descentralização fiscal da Constituição de 1988 e a modernização institucional das finanças públicas. A União perdeu grande pane dos instrumentos com que comandava a economia. O grosso do aparato intervencionista foi extinto: controle de preços e de capitais, orçamento monetário, monopólio estatal do açúcar e do trigo e a pletora de incentivos fiscais. A economia se abriu. A maioria das empresas estatais foi privatizada. A política econômica passou a depender mais de mecanismos indiretos. Restaram intervenções justificadas por falhas de mercado, como a do crédito do BNDES. Assim, restabelecer o “projeto nacional” seria não apenas um retrocesso. Implicaria ressuscitar mecanismos do período autoritário, o que é flagrantemente inconveniente, além de inviável.


O planejamento nos moldes brasileiros não existiu em países ricos, embora muitos tenham experimentado certos níveis de ativismo estatal, a maioria desmontada nos anos 1980 e 1990. O maior pólo americano de inovações, o Vale do Silício, não brotou de um “projeto nacional”. Empresas como Apple, Intel, HP, Oracle, Google e Facebook nasceram da combinação virtuosa de distintos fatores: a demanda de tecnologia das Forças Armadas, a formação de pessoal qualificado nas universidades de Stanford e Berkeley e um ambiente de negócios favorável ao empreendedorismo.


Há que enterrar a velha ideia do “projeto nacional”. Caberia pensar em outro “projeto”, o de mobilizar a sociedade para vencer, no máximo em uma geração, o desafio da melhoria da qualidade da educação. Vencer o atraso implicará treinar professores e remunerá-los pelo critério de desempenho. Adotar a prática do horário integral nas escolas. Ampliar a pré-escola e assim por diante. Todos ganharíamos, e não apenas os beneficiados pelos favores da intervenção estatal.

 Mailson Ferreira da Nóbrega

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