"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

sábado, 12 de junho de 2010

Presidentes repelem conselhos



por: Carlos Chagas


A Constituição de 1988 criou o Conselho da República como órgão superior de consulta do presidente da República, dele participando o vice-presidente, os presidentes da Câmara e do Senado, os lideres da maioria e da minoria nas duas casas do Congresso, o ministro da Justiça e mais seis cidadãos brasileiros natos, designados dois pelo presidente, dois pela Câmara e dois pelo Senado.


O Conselho da República tem como competência pronunciar-se sobre intervenção federal, estado de defesa e estado de sítio, bem como sobre questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas.


Comporta-se o governo como se essa instituição não existisse. Jamais o presidente Lula reuniu o Conselho da República. Nem Fernando Henrique, nem Itamar Franco, muito menos Fernando Collor e José Sarney. No começo houve a designação dos seis brasileiros ilustres com mandato de três anos, como Paulo Brossard, Almino Afonso e outros. Agora, nem isso.


Exemplo mais recente de estar sendo descumprida a Constituição está na iniciativa do Procurador Geral da República de solicitar ao Supremo Tribunal Federal a intervenção em Brasília. O pedido dorme nas gavetas da mais alta corte nacional de justiça, sem prazo para deliberação, mas alguém tem notícia de que o presidente Lula convocou o Conselho da República para apreciar o ato do chefe do Ministério Público por ele mesmo nomeado? Descumpriu-se, assim, a nossa Lei Fundamental, sem que ninguém se desse conta.


Motivos para a convocação do Conselho da República acumulam-se através dos anos. Em 2005 as denúncias sobre o mensalão colocaram em xeque a estabilidade das instituições democráticas, tanto que no Congresso cogitou-se até do impeachment do Lula. Nada aconteceu. Ainda agora a tentativa de revogação da Lei da Anistia também caracterizou a hipótese de desestabilização institucional. Silêncio total no palácio do Planalto, ainda bem que o Supremo resolveu a questão.


Suponhamos a eclosão de uma crise nas instituições democráticas, como a decisão do Piauí de separar-se da União ou a mobilização dos monarquistas para coroar o Lula como Imperador Perpétuo do Brasil. Bobagens, dirão os doutos, mas possíveis, alerta a Constituição pela simples criação do Conselho da República em seus artigos 89 e 90. O problema é que se o presidente fosse obrigado a convocá-lo, da noite para o dia, não teria como. Porque não está constituído. Faltam os seis cidadãos maiores de 35 anos…


Na Defesa, repete-se a omissão


Outro órgão constitucional de consulta do presidente da República igualmente ignorado e desprezado pelos detentores do poder é o Conselho de Defesa Nacional, polvilhado de mais ministros e de comandantes militares. Também jamais se reuniu, ainda que em suas atribuições encontre-se opinar sobre a decretação de intervenção nos estados e no distrito federal.


A omissão do palácio do Planalto surge até mais gritante do que no caso do Conselho da República. Tome-se, em sua competência variada, a obrigação do Conselho de Defesa Nacional “de propor critérios e condições de utilização de áreas indispensáveis à segurança do território nacional e opinar sobre seu efetivo uso, especialmente na faixa de fronteira e nas relacionadas com a preservação e a exploração de recursos naturais de qualquer tipo”.


Há quanto tempo imensas glebas tem sido entregues a tribos indígenas? E nas faixas de fronteira, como o território hoje em poder dos Ianomani, como a reserva Raposa-Serra do Sol, posta à disposição de diversas etnias. Por coincidência, recursos naturais existem aos montes nessas regiões, de minerais nobres como nióbio e urânio até jazidas variadas de ouro e diamantes. Deram de ombros Fernando Henrique, que inaugurou essa singular temporada de doações próximas da irresponsabilidade e à disposição da cobiça internacional, e Luiz Inácio da Silva, que vem completando com rara diligência a alienação de partes do país.


Não teria sido o caso de múltiplas reuniões do Conselho de Defesa Nacional, nos últimos dezesseis anos, ao menos para apreciar a lambança? Mas alguém se reuniu?


Há quem atribua ao corporativismo partidário tamanha ausência de iniciativas obrigatórias. Primeiro os tucanos, agora os companheiros, igualam-se no desprezo e no medo da participação de setores infensos a rezar pelas suas cartilhas de governar. O absolutismo dos presidentes da República e de seus acólitos revela-se como razão maior desse comportamento egoísta. São eles que devem decidir sobre tudo, sem conselhos de qualquer espécie…


Por último, os ex-presidentes


Tanto na lei quanto nos costumes, são muitos os países onde seus ex-presidentes são freqüentemente convocados pelos governos atuais. Mesmo adversários, pertencendo a partidos distintos, em momentos cruciais eles contribuem com sua experiência para a solução de problemas graves. Alguns, até, tem assento nos respectivos Senados, faltando-lhes apenas o direito de voto, entre os demais.


Não raro a gente vê na televisão ex-presidentes dos Estados Unidos cumprindo missões ou reunidos para assessorar o último sucessor. Como ex-presidentes da França, também.


Aqui entre nós, numa única oportunidade, nos últimos oito anos, o presidente Lula reuniu seus antecessores, mesmo assim excluindo Fernando Collor, então respondendo a processo no Supremo Tribunal Federal. Foi quando voaram com ele, para Roma, José Sarney e Fernando Henrique, unindo-se lá a Itamar Franco, então embaixador do Brasil na Itália, para a coroação do papa Bento XVI.


É claro que agora, em período eleitoral, ficam mais difíceis os conselhos e até os diálogos entre personalidades tão díspares, mas o futuro presidente da República, seja José Serra, seja Dilma Rousseff, só teriam a ganhar se de quando em quando convocassem os antecessores, a começar pelo Lula, Fernando Henrique, Itamar Franco, Fernando Collor e José Sarney. Ou se deixarão levar pelo absolutismo?

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